quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Apocalípticos e Integrados - Parte I

Num relance corajoso pela minha estante de livros decido-me por Eco. Não Baudolinos e Nomes de Rosas mas o referido muitas vezes como clássico Apocalípticos e Integrados. A capa desencoraja, esta edição da DIFEL de 91, com tradução de Helena Gubernatis, peca pela baixa capacidade de atracção, a sinopse na contra-capa é quase ilegível dada a errónea escolha de cores (nesta análise intencionalmente superficial estarei a queixar-me da falta de integração do editor?).

Só ainda li a introdução e o prefácio e não cedi ainda parte alguma do meu entusiasmo inicial ao vil bocejo que espreita sempre por detrás de qualquer escravo de classe média. Ao que parece todos estes anos vivi como um Apocalíptico degenerado (ou como um Integrado desmotivado?). Ou seja, esta dicotomia que hoje em dia é talvez bastante constante nos escaparates da sua própria génese, a cultura das massas, ou, como o autor alterna "comunicação das massas", é-me em tudo familiar. Por um lado esta dual classificação, se redutoramente assim o quisermos chamar, abarca, a par com os derivados conceptuais mais ou menos próximos, todo o pensamento que se possa ter sobre cultura moderna e, de uma forma paralela, de comunicação. Por outro lado, o sentido de pertença (a um grupo, organização, etc.) que é tão necessário ao Homem como a água que bebe, ajuda de forma indelével à tomada de lados. E lados são dois, aqui não nos damos ao luxo de augurar mais do que a bidimensionalidade ideológica.

Bem, mas não quero atropelar o Umberto com divagações de coerência duvidosa, mas sim explorar alguns dos termos e afirmações que encontrei no prefácio e até antes, na nota introdutória.

Destaco, na introdução, a clarividência de Eco ao sublinhar que esta obra é, per se, algo datada. E não porque o autor tenha sucumbido a uma qualquer insane modéstia, mas porque o tema em si está constantemente em evolução, devorando por isso a actualidade de quaisquer dissertações ou projecções por mais ambiciosas e fundamentadas que sejam - "Como escrevia hoje este livro?Já o dizia no prefácio de 1964, fazer a teoria das comunicações de massas é como fazer a teoria de quinta-feira próxima". Penso que isto não quer dizer que se considere este ensaio como datado no seu âmago: este representa talvez um corajoso sopro iluminista numa época em que, como o próprio autor nos mostra, a elite intelectual se mantinha no cume da montanha da análise do clássico e erudito enquanto no vale o efeverscente fenómeno da cultura de massas progredia a olhos vistos. Resumindo: o que me parece hoje mais actual do que talvez na socieadade de 60 em que a circulação de informação, apesar de já apresentar alguns contornos disso, não era global, é a possibilidade de, ao nos colocarmos na posição de críticos de algo, esse algo ser exactamente aquilo que nos permite a crítica. Por outras palavras, inquieta-me o carácter de certa forma revelador que este livro pode representar, relativizando a minha posição de Apocalíptico, fazendo-me ver, num infeliz exercício de auto-reconhecimento que degenerei num Integrado (sim, estou a assumir um preconceito que felizmente o autor não assume na sua análise).

No entanto esta minha análise é só diagonal porque só explora um pouco do choque inicial, antevendo que não será manobra fácil, como o próprio autor insiste em provocar, a de decidir com qual dos lados estamos mais sintonizados.

Sim,

Vamo lá ver.